Todas as vezes que são divulgados os resultados do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), chama a atenção a quantidade de candidatos que conseguem obter a máxima pontuação, na prova de redação, que é de 1000 pontos. Quantidade essa, mais precisamente 60 candidatos, que chama bastante atenção, porque ainda é proporcionalmente muito pequena, quando comparada, por exemplo, com os cerca de 2,7 milhões de candidatos que participaram da mais recente edição do exame, em novembro de 2023, mas que vem animadora e discretamente aumentando, ano após ano, indicando que pode estar havendo alguma evolução favorável na formação estudantil, com os alunos aprendendo cada vez mais a aplicar seus conhecimentos sobre as regras de uso da linguagem formal na produção de textos técnicos. Pelo menos, teoricamente.
Entretanto, cabe uma observação. Acontece que a maioria daqueles que conseguem "fechar" a prova de redação, como se diz popularmente, aspiram às vagas nos cursos de medicina, que são mais difíceis de conseguir. Eles são, portanto, estimulados a ser mais competitivos, estabelecem metas altas e buscam as melhores pontuações possíveis para, consequentemente, obter as melhores colocações possíveis e aumentarem substancialmente as chances de conseguir vagas nas faculdades de medicina mais renomadas e mais próximas de suas moradias. Será que os outros estudantes, independentemente da carreira almejada, não deveriam ser igualmente incentivados a escrever bem???
Mas parece que nem tudo está perdido. Há um oásis, bem no meio desse árido deserto. Você deve ter tomado conhecimento de uma notícia acalentadora de que, numa escola estadual de ensino médio, em Acaraú, cidade do litoral norte do Ceará, dos 164 concludentes que se submeteram ao certame, 129 obtiveram notas superiores aos 900 pontos, na parte da redação. Detalhe: nem todos eles querem medicina. Mesmo assim, parece que ainda vivemos imersos numa cultura educacional em que apenas determinadas carreiras profissionais, bem como os estudantes mais propensos a seguir essas carreiras profissionais, são devidamente valorizados. Persiste, em nosso meio, aquele mito de que apenas certas profissões podem favorecer o sujeito a viver com padrão de vida elevado e com dignidade em sociedade.
Comparemos a situação do jovem secundarista norte-americano com a de seu congênere brasileiro, guardadas as devidas proporções, é claro. Quais são as expectativas de cada um deles? Bom, como você já deve ter visto em diversos filmes que abordam o cotidiano de quem está prestes a deixar sua high school, tudo que eles mais querem é obter um bom desempenho global, não apenas com as melhores notas possíveis em todas as matérias, mas também preenchendo seus currículos com participações em atividades comunitárias e, sobretudo, se destacando em atividades esportivas, no meio escolar, tudo isso visando a aceitação na melhor universidade possível, preferencialmente com uma bolsa de estudos (nos Estados Unidos, o ensino superior é pago pelo próprio estudante, seja público ou privado). Ou seja, tudo que o concludente de ensino médio americano quer é entrar na universidade. O curso, pouco importa, em princípio. Em comparação com o Brasil, proporcionalmente falando, poucos jovens se interessam em tentar entrar numa faculdade de medicina, porque eles entendem que, além de as exigências serem maiores, os custos também, o sujeito precisa saber direito aonde está se metendo. No Brasil, o concludente do ensino médio, em geral, também quer entrar numa universidade, mas seus objetivos geralmente já vem afunilados para uma determinada carreira profissional. A depender do curso escolhido, os custos podem não ser tão inacessíveis assim. O governo também oferece alguns facilitadores, como FIES e PROUNI, por exemplo. Independentemente de questões político-partidárias, convenhamos que o governo tem procurado democratizar e ampliar o acesso ao ensino superior no Brasil, na últimas décadas, de um jeito ou de outro. Se aquele processo foi salutar ou não, aí já são outros quinhentos. Quiçá você concorde conosco, principalmente se tiver sido beneficiado ou beneficiada com medidas como o REUNI, por exemplo.
Em suma, o que queremos lhe dizer é que, nos Estados Unidos da América (EUA), não há toda essa obsessão, essa glamourização e esse endeusamento de uma profissão, em detrimento de outras, como se vê, aqui no Brasil, não obstante certas profissões gozem de um certo status, em qualquer lugar.
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