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sábado, 31 de agosto de 2013

O caranguejo e o veado


          Na manhã da última terça-feira, estava ouvindo no rádio uns comentários sobre o incidente que tomara lugar na Escola de Saúde Pública do Ceará, em Fortaleza, na noite anterior, quando, após a apresentação pública de alguns dos médicos estrangeiros que vieram ao Brasil para participar do programa Mais Médicos, alguns daqueles médicos, que eram cubanos, foram insultados com vaias e alcunhas pejorativas por alguns de seus congêneres brasileiros.


          Pois bem, depois daquilo, a imprensa e a opinião pública se voltaram mais ainda contra a classe médica, que, a cada dia que passa, está sendo cada vez mais taxada de egoísta. No entanto, o que mais me intrigou naqueles comentários do rádio, na terça-feira, foi o fato de que os médicos chegaram a ser comparados, por uma das articulistas mais experientes da imprensa cearense, com uns caranguejos, pois, segundo ela, os médicos só querem trabalhar no litoral.


          Fiquei meio indignado com aquela comparação, pois, além de pejorativa, é incompatível com a realidade. Se fosse verdade, não haveria médicos em lugares como Amazonas, Minas Gerais e Distrito Federal, por exemplo. Se, porventura, a maioria dos médicos brasileiros estão residindo e trabalhando em cidades do litoral brasileiro, isto se deve pelo mesmo motivo que levou a maior parte da população brasileira a se estabelecer em cidades do litoral brasileiro, onde estão as cidades mais desenvolvidas. E os médicos vão aonde a população vai. Tudo isto é resultado do processo de colonização e de desenvolvimento do Brasil, ao longo de sua história. Os médicos tem também outras razões que já foram discutidas, para se distribuírem pelo território nacional desta maneira, como a falta de condições estruturais de trabalho e de vínculos empregatícios confiáveis, por exemplo.


          Se, por um lado, quem fixa residência e trabalho no litoral é chamado de caranguejo, por outro lado, como já foi dito uma vez, àquele que manifesta intenção de se aventurar a trabalhar no sertão é dito que quem gosta de correr mato adentro é veado. Replico que o vaqueiro também corre mato adentro e o vaqueiro, em geral, é um cabra macho. Então, não pense que ouvir a voz que vem do interior e voltar-se para seu interior é fugir como covarde. Pelo contrário, é enfrentar seus demônios e superar limitações.




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