Neste 5º dia de julho, Sobral, que ainda é considerada a Princesa do Norte do Ceará, especialmente agora, por ser a nova capital do Estado, esteve completando mais uma primavera. Fazendo jus a isto, experimentou também o clima de primavera que esquentou as principais cidades do país, nas últimas semanas. Como bom filho adotivo da terra, não podia deixar de tecer algumas palavras para a ocasião.
Folgo em saber que Sobral tem-se destacado em âmbito nacional, no tocante à educação, que, embora não seja tão excepcional assim e os professores da rede pública não sejam tão bem remunerados, assim como não o são em lugar algum, pelo menos não faz o Ceará e o Brasil passarem vergonha, diante do resto do mundo, como tem feito Juazeiro do Norte. Folgo também em saber que Sobral foi eleita "a cidade do futuro", apesar de estar engatinhando, em desenvolvimentos econômico, social, cultural, tecnológico e estrutural. Quiçá esse futuro ainda seja um tanto abstrato e invisível à olho nu, mas convenhamos, trata-se de uma cidade promissora, porque tem potenciais para crescer e para atrair pessoas de outros lugares para fazer parte daquela comunidade, às quais esta nobre dama parece poder oferecer oportunidades de trabalho relativamente bem remunerado e de qualidade de vida.
Entretanto, infelizmente, há algumas observações que preciso fazer e que estão entaladas, não na minha garganta, mas nas terminações nervosas que se dirigem aos meus dedos, desde que lá morei, há alguns anos. Acontece que a princesa não é bem essa mãe generosa e hospitaleira que parece.
Quando morava lá, graças à Deus, conseguia viver, não com muito luxo, porém confortável e modestamente, com o dinheiro enviado por meus pais, mas me perguntava como é que as pessoas mais pobres do lugar conseguiam sobreviver, porque, mesmo recebendo Bolsa Família e outras benesses do governo, ter acesso às necessidades primárias, como alimentação e vestuário, por exemplo, para eles, deveria ser muito mais difícil do que em outros lugares.
Chamada carinhosamente de "Estados Unidos de Sobral", quem visita a cidade deve realmente acreditar que está nos Estados Unidos, mas não por causa do clima, do aspecto das vias ou do jeito de falar das pessoas, mas pelo preço dos produtos e dos serviços disponibilizados. O visitante percebe que ainda está no Brasil e que poucos sobralenses falam inglês ou francês fluentemente, mas deve pensar que todos os sobralenses recebem seus vencimentos em dólares. Deve pensar também que Sobral, se não foi uma das cidades-sede da Copa das Confederações, será uma cidade-sede da Copa do Mundo, para o ano. Você vai entender o porquê disto, em breve.
Em vez de "Estados Unidos de Sobral", deveria se chamar "Reino Unido de Sobral", devido à sua maior semelhança com a Inglaterra, pela opulência de suas edificações e de sua burguesia, que vive basicamente de bajulação, de fofoca e de especulação imobiliária, pela concentração de renda, pelo custo de vida elevado e pela exclusão e desigualdade sociais, que, para quem conhece aquela realidade de perto, ficam mais evidentes do que ficariam em Fortaleza, que já foi considerada uma das cidades com maior concentração de renda do mundo.À título de curiosidade, muitas ruas do centro histórico foram batizadas com nomes de coronéis.
Uma das coisas que mais me revolta em Sobral, juntamente com a carestia generalizada, é a eterna alta dos imóveis pela especulação imobiliária. São problemas bem antigos e prevalentes, independentemente de quais partidos políticos estejam no poder. O fato é que ninguém procurou tomar providenciar para resolver esses problemas. Todo mundo aceita tudo calado, sob as bênçãos de alguém. São mostras de que a burguesia local se acha muito gostosa e que acha que tudo que ela constrói é gostoso.
A cidade inteira parece estar rateada, como se fosse um tabuleiro de um jogo de Monopólio ou de Banco Imobiliário, como preferir. Está quase tudo dominado. Muitos imóveis concentrados nas mãos de poucos. Quase ninguém é dono do seu pedaço de chão. O sobralense desembolsa uma fortuna para alugar ou comprar um lugar para ser seu lar e, além de viver de maneira medíocre e sufocado com sua família, em cubículos apertados e colados um ao outro, parede com parede, com a frente para a rua estreita, resumida ao portão ou porta da casa, no centro da cidade, ainda tem de se sujeitar à prepotência e à arrogância de algum "Seu Barriga" da vida, quando paga aluguel. Assim, os cidadãos sobralenses vão sendo expulsos gradativamente para a periferia. Na cidade velha, ficam apenas os portadores dos sobrenomes tradicionais do lugar, e olhe lá.
Pagar aluguel é degradante e vão. Não tem sentido passar anos pagando algo que nunca será seu. Aluguel de imóveis deveria ser temporário. Cada cidadão deveria ter direito ao seu lar, assim como já acontece em alguns países europeus.
A burguesia local só precisa agora de asas para poder voar. Ela mal pisa no chão. Não tardará muito para que seja beneficiada com um plano do governo federal que visa reestruturar ou construir novos aeroportos regionais, em todo o país, inclusive em Sobral.
Por essas e outras, compreendo a debandada geral de muitos de meus companheiros dos tempos de faculdade e as esquivas deles à ideia de retornar à Sobral, que, apesar de ser os "Estados Unidos de Sobral", não é bem aquela terra das oportunidades que os forasteiros pensam. Não guardo mágoa de Sobral, nem de sua população. Me preocupo com o destino daquelas pessoas e me encolerizo contra as injustiças sofridas por elas. Não acredito que elas sejam felizes vivendo assim. Espero que um dia o povo sobralense conheça o significado da palavra "liberdade". Enquanto isso, aguardo boas notícias, aqui no exílio, até o fim desta temporada forçada.
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