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domingo, 4 de novembro de 2012

Último suspiro 2


                               Comecei a postagem anterior querendo falar sobre a morte, mas não necessariamente sobre a morte humana, mas também sobre a morte lenta e gradual da assistência médica psiquiátrica em nossa cidade. Antes disso, faz-se necessário complementar que mais importante do que se preocupar com a morte e com o que se vai encontrar do outro lado é aprender a viver. Confesso que, com pouco mais de trinta anos de caminhada, ainda não estou sabendo viver adequadamente. Espero não aprender essa arte muito tarde

                               Pois bem, somente agora tenho a oportunidade de abordar a questão da morte da saúde pública e gratuita, pois a postagem anterior acabou saindo mais extensa do que o esperado, por conta de meu jeito peculiar de escrever. Enfim, depois preciso conversar mais sobre este meu método de escrever. Estou preparando um ensaio exclusivamente sobre isto.
 

                                Não podia deixar de registrar aqui um fato lamentável e que terá repercussões significativas para a população fortalezense. O IPC (Instituto de Psiquiatria do Ceará) encerrou as atividades de seu setor de urgências psiquiátricas e de seu hospital-dia, na última quarta-feira, dia 31 de outubro, mantendo-se em atividade apenas a clínica de consultórios privados que atendem planos, convênios e particulares e que pertencem à mesma empresa proprietária do IPC. Fala-se em suspensão temporária do atendimento pelo SUS (Sistema Único de Saúde). No entanto, cá para nós, com os valores que o SUS paga aos seus prestadores de serviços, especialmente os servicos psiquiátricos, tornou-se insustentável financeiramente manter um serviço como o IPC em funcionamento.

                                Rebento de uma época em que era rentável abrir hospitais, clínicas e outros estabelecimentos de saúde com capital privado, prestar serviços gratuitos à população e receber os honorários do poder público, o IPC foi criado há quase meio século pelo doutor Jurandir Picanço, um dos patronos da medicina em nossa região e um dos fundadores da primeira faculdade de medicina do Ceará.

                                Agora aquele conjunto de pacientes neurológicos e de pacientes psiquiátricos que não eram assistidos pelos serviços médicos do poder público mas que encontrava abrigo no IPC fica sem suporte. Teoricamente, eles poderiam ser encaminhados aos CAPSs (Centros de Atenção Psicossocial). O problema é que a maioria dos CAPSs não tem recursos material e humano suficientes para acolher aqueles pacientes. O que deve acontecer com eles, então??? Esperamos que a nova gestão municipal traga alguma resposta.

                                O IPC já vinha desacelerando suas atividades, há algum tempo. Seus leitos para internação hospitalar intensiva destinados ao SUS, que ficavam em sua matriz, num quarteirão contíguo, porém do mesmo lado da avenida Bezerra de Menezes, a antiga Casa de Saúde São Gerardo, construída curiosamente em um terreno que pertencia à família da escritora Rachel de Queiroz e inaugurada em 1935, foram desativados, há mais de um ano e meio. Mais recentemente, o setor de pronto-socorro deixou de funcionar 24 horas por dia para funcionar apenas no período diurno, devido às carências de recursos e de profissionais. 

                                O pronto-socorro psiquiátrico do IPC foi o penúltimo de sua especialidade em Fortaleza. Resta agora apenas o pronto-socorro do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto ou Hospital de Saúde Mental de Messejana (HSMM), como preferir. Lá devem se concentrar, desde as ambulâncias com os pacientes mais graves, da Grande Fortaleza e do interior, até aqueles pacientes que "só querem uma receitinha azul", e as filas de espera por leitos de internação devem aumentar, haja vista que, ao contrário do que pensam alguns, os CAPSs não conseguem dar conta de todos eles. O prognóstico é desolador.

                                Antes de dar uma pausa nesta conversa, permita-me apenas explicar como o HSMM mudou de nome. Foi uma forma de homenagear o psiquiatra Gerardo da Frota Pinto, um dos fundadores da primeira faculdade de medicina destas plagas, que faleceu em agosto de 2011. Ele também se destacou por ter sido membro do serviço de saúde mental do Ministério da Saúde, por ter participado da inauguração do hospital que agora leva seu nome, em 1963, e, quase vinte anos depois, da instalação do programa de residência médica em psiquiatria daquele hospital, a primeira residência médica da especialidade em nosso Estado. 

                              


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