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quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Para ler e pensar 4


                          Naqueles dias, Elias pôs-se a caminho e foi para Sarepta. Ao chegar à porta da cidade, viu uma viúva apanhando lenha. Ele chamou-a e disse: "Por favor, traze-me um pouco de água numa vasilha para eu beber". Quando ela ia buscar água, Elias gritou-lhe: "Por favor, traze-me também um pedaço de pão em tua mão". Ela respondeu: "Pela vida do Senhor, teu Deus, não tenho pão. Só tenho um punhado de farinha numa vasilha e um pouco de azeite na jarra. Eu estava apanhando dois pedaços de lenha, a fim de preparar esse resto para mim e meu filho, para comermos e depois esperar a morte".
Elias replicou-lhe: "Não te preocupes! Vai e faze como disseste. Mas, primeiro, prepara-me com isso um pãozinho e traze-o. Depois farás o mesmo para ti e teu filho. Porque assim fala o Senhor, Deus de Israel: 'A vasilha de farinha não acabará e a jarra de azeite não diminuirá, até o dia em que o Senhor enviar a chuva sobre a face da terra'". A mulher foi e fez como Elias lhe tinha dito. E comeram, ele e ela e sua casa, durante muito tempo. A farinha da vasilha não acabou nem diminuiu o óleo da jarra, conforme o que o Senhor tinha dito por intermédio de Elias.
Reis 17, 10-16

                         Esse texto me fez refletir sobre a importância de compartilhar o pão e outras necessidades primárias. Reza a lenda que todo cristão deve dar esmolas aos seus irmãos mais necessitados, além de fazer alguma obra de caridade, rezar e fazer alguma penitência ou jejum. Aqui, quando se fala em jejum, o sentido não se restringe ao significado de uma restrição alimentar forçada. Entenda-se como jejum a abstenção temporária de outros elementos da vida que não são considerados essenciais à sobrevivência, como a compra de uma roupa, de um aparelho eletrônico, de um ingresso para o cinema, entre outros.

                         Neste momento, quero e devo deter-me na questão da esmola, especialmente na partilha do pão. Por vezes, quando estou fazendo alguma refeição, sinto uma sensação de culpa. Vejo minha mesa farta e penso que aquilo que sobra aqui está fazendo falta para alguém, e que aquilo que eu como demais alguém está comendo de menos. Por vezes, procuro pensar em algo para tentar diminuir essas distorções. De uns anos para cá, não apenas por conta dessa sensação de desperdício, mas também por conta da sensação de excesso de peso, estou procurando reeducar minha dieta por conta própria. Estou procurando comer apenas o que considero necessário para me nutrir, quando considero necessário. Esporadicamente, estou fazendo jejum alimentar, em respeito ao meu corpo e em respeito àquelas pessoas que não têm liberdade para comer nem ao menos o essencial para sobreviver.

                          Reza a lenda que nunca devemos nos recusar a repartir o pão com quem nos pede, usando o argumento de que ele não é suficiente para nós e nossos familiares. Considere que, quando alguém nos pede comida, é porque Deus nos enviou essa pessoa à nossa procura, porque Ele sabe que a comida é suficiente para todos. Deus abençoa nosso pão da cada dia e ele se multiplica. Assim, se não o repartimos, boa parte dele se estraga.

                          Sem querer entrar no lado político da questão, mas, de qualquer maneira, reconheçamos que o pobre indigente não deve ser alimentado ad eternum por políticas assistencialistas. Dar esmolas é importante, em princípio. A esmola não resolve os problemas do desemprego, da fome e da mendicância, mas salva algumas vidas, temporariamente. Cedo ou tarde, é importante também que o indivíduo necessitado aprenda a deixar de viver às custas de esmolas e aprenda a caminhar com suas próprias pernas, quando puder produzir seu sustento e de seus familiares por si mesmo.

                          Acho que já havia escrito algo sobre isso que estou escrevendo agora, especialmente quando escrevi algo sobre justiça social. Sou muito emotivo. A palavra "fome" é uma das palavras mais fortes que posso ouvir, porque é capaz de ferir-me os ouvidos e deixar meus olhos rasos de água. Não consigo dormir bem, nem me alimentar à vontade, sabendo que alguém passa fome em algum lugar. 

                          Para finalizar, uma coisa que me intriga é que, não sei se é por ser meio paranóico, mas, por vezes, transitando por aí, tenho a impressão de que todos os indigentes desta cidade sempre vem a mim, só a mim. Parado nos cruzamentos, os pedintes e os limpadores de parabrisas só vem a mim. Numa cidade com quase três milhões de habitantes, há quem pense que sou o único médico do lugar, como se fosse o único a dirigir um utilitário esportivo e o único com cara de rico. Vai entender essas coisas. Depois conversamos mais sobre isso.



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